Editais da Ancine: verba fácil para as grandes empresas ou pontapé inicial para as pequenas?

16/10/2018 | 23:30

Por - Lorena Roje

(Foto: divulgação do filme "Minha Mãe É Uma Peça 2", sucesso de bilheterias no Brasil)

“São extremamente complicados, muito exigentes, mas são necessários para o nosso mercado funcionar. Ainda somos dependentes desta primeira linha impulsionadora” é o que afirma o diretor da Centrípeta Filmes, Emerson Muzeli, sobre os editais da Ancine. É fim de setembro, ânimos exaltados no mundo audiovisual. Isso porque, depois que a Ancine divulgou seu novo sistema de pontuação baseado em desempenho comercial, o medo das pequenas empresas cinematográficas, ainda mais daquelas fora do eixo Rio-São Paulo, é que os peixes grandes do cinema devorem a maior parte da verba.

Em relação às críticas ao novo sistema formatado pela Ancine, os critérios de entrada nos editais incluem pontuação de diretores, produtoras, e distribuidoras. Essa pontuação, em relação aos diretores, está relacionada a performance comercial de suas obras, além do desempenho em festivais e mostras dos seus filmes. Produtoras são julgadas por três subquesitos: Capacidade Gerencial, Desempenho Comercial e Desempenho Artístico. Em relação às distribuidoras, são observados dois subquesitos: número de obras nacionais e internacionais lançadas desde 2009, e também desempenho comercial recente.

O problema é que essas pontuações são necessárias para a liberação do FSA - Fundo Setorial do Audiovisual, e há um grande abismo que separa, por exemplo, o desemprenho comercial de grandes e pequenas empresas. Exemplo disso é a distribuidora Downtown Filmes, responsável pelo blockbuster "Minha Mãe é Uma Peça 2", que arrecadou R$ 180 milhões só em 2017 com todas suas produções, e tem pontuação máxima nos quesitos do edital. Enquanto isso, empresas menores, como Pindorama Filmes, Ebisu Filmes, Osmose Filmes, juntas, não chegam nem a R$ 10 mil arrecadados, e todas possuem nota 2 no quesito Público Alcançado. Assim, devido ao crescimento e vantagem na corrida dos peixes grandes, o abismo se alarga ainda mais.

A realidade do mercado audiovisual denuncia que a trajetória das empresas do ramo ainda é difícil no cenário atual, que ainda depende muito do incentivo do Estado para a produção de conteúdo. Apesar do estímulo público ter aumentado gradativamente com os anos e a qualidade das produções nacionais terem elevado de patamar, o consumo de filmes nacionais não cativou tanto assim o público, o que afasta incentivos privados, que poderiam colaborar no crescimento de empresas menores.

Ainda segundo dados do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual, proposto pela Ancine, um ranking trouxe os nomes dos 20 filmes que mais atraíram bilheteria nos últimos 8 anos - e, desse total, só 3 eram brasileiros.

(Ranking dos 20 filmes de maior bilheteria 2017/ Dados do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual)

O apelo de filmes de comédia brasileiros sempre se sobressaiu em comparação a outros gêneros, e isso também reflete na distribuição da renda entre os filmes. Filmes nacionais de comédia concentraram 80% das maiores bilheterias do país entre 2009 a 2017. Sobre o sucesso de filmes de gêneros mais populares, Emerson Muzeli afirma: "Os conteúdos mais vendáveis são sempre os que tem maior liquidez com o público, são necessários para equilibrar a nossa carteira de projetos. Nosso DNA é muito referencial a projetos como este que carregam “valor cultural” e que para negociação em temporadas precisam ser mais desenhados em narrativa e força"

Sobre a Ancine

Criada em 2001 pela Medida Provisória 2228-1, a ANCINE – Agência Nacional do Cinema, é uma agência reguladora que tem como atribuições o fomento, a regulação e a fiscalização do mercado do cinema e do audiovisual no Brasil. É uma autarquia especial, vinculada desde 2003 ao Ministério da Cultura, com sede e foro no Distrito Federal e Escritório Central no Rio de Janeiro.