A negritude feminina no cinema brasileiro
- UFUPIC
- 18 de dez. de 2018
- 14 min de leitura
Atualizado: 21 de dez. de 2018
18/12/2018
Por - Anna Júlia Lopes
O Brasil, apesar de sua miscigenação, ainda é um país racista, mesmo que de forma velada. A tão falada “miscigenação” sempre foi referente aos colonos portugueses que estupravam as escravas negras e as indígenas, que sempre tinham os seus filhos como não reconhecidos e ainda eram castigadas por “seduzir” os senhores de engenho. O peso de ter nascido mulher nunca se limitou apenas à concepção de ser mulher, pois o “nascer negra” também deve ser levado em conta, principalmente em uma sociedade patriarcal de um país ainda subdesenvolvido, com histórico, mentalidade e tradição colonial europeia e escravocrata, que moldaram uma visão dos negros sobre si mesmos que considerava que a cor de sua própria pele era sinal de inferioridade. Sendo o Brasil, o último país ocidental a abolir a escravidão.


O racismo e a misoginia são distribuídos em larga escala pela indústria cultural. Como? Bem, não contratando negros, contribuindo para estereótipos pejorativos, tentando amenizar a sua negritude, entre outras maneiras. A falta de espaço das mulheres negras no cinema é um grande reflexo de como a sociedade é cruel para esse grupo, atrapalhando principalmente no desenvolvimento de meninas e mulheres negras, que por não terem representatividade não se reconhecem como tal, e não encontram em lugar algum o seu lugar de fala e o “porquê” de serem diferentes de suas amigas brancas.


Nátaly Neri, estudante de ciências sociais da Unifesp e youtuber negra e dona do canal “Afros e Afins” trata em seus vídeos sobre assuntos como autodescobrimento, identidade, autoestima, dificuldades e até mesmo espiritualidade da mulher negra. Em seu mais novo projeto “Negritudes Brasileiras”, um documentário longa-metragem, ela reúne várias mulheres negras para tratar dessa questão identitária da negro brasileiro.

O autodescobrimento
O cinema poderia ter grande influência positiva em várias crianças e adolescentes, se retratasse mulheres negras como protagonistas e como indivíduos importantes. Outra questão importante é como seria de extrema importância e ajuda tratar a pele negra sem tentar embranquecê-la. As pessoas não sabem se reconhecer como negras e isso tem sim grande influência da mídia e do audiovisual, que ameniza a cor delas, tratando-as como “morenas” ou mulatas”. Todo o processo de autodescobrimento de uma negritude perdida e escondida pela sociedade seria facilitado se o cinema o notasse. Em entrevista, algumas das mulheres que fizeram parte do documentário de Nátaly falam sobre a descoberta de sua negritude e o que as define como negras. Isabela Alves, artista, comenta: “Acredito que seja possível se descobrir negra. Mas, é um processo muito íntimo quando se trata de pessoas de pele mais clara, e um processo muito externo quando se trata de pessoas com pele mais escura, penso eu. Minha negritude se dá dentro de mim, e fora de mim. Tento fugir de ser negra só pelo racismo, também sou negra pela minha história, minhas conquistas, minha família. Tenho mãe, pai e irmão pretos! Conquistas e condições, de pessoa preta também! Ainda estou na busca de compreender o que é negritude”. Para Ary Silva, estudante que também participou do documentário, a negritude vem de dentro e trata-se de se reconhecer além da cor da sua pele: “Ainda tem muitas pessoas negras que se acreditam como iguais e que acreditam fielmente que racismo não existe, mas a gente sabe muito bem que continuam se odiando por ser quem são ou por terem o corpo que tem. Mas enfim, para cada um é uma questão totalmente diferente. Hoje eu sei que isso é uma coisa histórica, é algo que vem sendo passado de geração em geração, como foi passado para mim, através da minha vó. Minha vó tinha uma pele mais retinta, ela sempre falava para mim e para minha mãe pra pegar uma pessoa mais branca para clarear a família. E assim tem sido, é possível ver como a família foi se modificando drasticamente. Aí também vem o famoso ‘moreninha’, ‘ah, ela é mulata’, ‘ela é mais clarinha’ e todos os outros jeitos de falar para embranquecer o negro, deixando cada vez mais confuso o brasileiro quando se trata de questões raciais, e até mesmo dividindo os negros entre si. Só aí que vamos trazer mais esclarecimento para todo mundo, principalmente para a comunidade negra.”

Colorismo e pigmentocracia no audiovisual brasileiro
Como a indústria cinematográfica retrata a negritude no cenário brasileiro? Não retrata! Não apenas no setor audiovisual, mas como em todos os setores é preferível “amenizar” a situação, mostrar que uma pessoa pode ter valor, afinal, ela nem é tão negra assim. As atrizes que são procuradas para fechar a cota de pessoas negras em um elenco geralmente não são negras retintas e com traços tipicamente de negros africanos, são sempre uma “mistura”, uma “amenizada”, com traços mais finos e “brancos” e cabelos com cachos definidos, ao invés de crespos. O colorismo ou a pigmentocracia são termos para definir a discriminação presente na sociedade, que quanto mais escura for a pele, maiores as chances de haver preconceito. Thamy Yosuke, atriz que também fizera parte do projeto “Negritudes brasileiras” afirma: “eu acredito que quanto mais clara for a pele ‘menos você sofre’ se é que dá para falarmos assim, porque eu sofri muito com o racismo mesmo tendo a pele clara. O racismo é cruel até nisso, porque se você tem a pele clara você pode ser menos negra, mas também não se torna branca, então você fica naquele meio termo, quase nos falta identidade, identificação, e acabamos sendo levadas ao equívoco. Acho importante entender essas questões justamente para aprender a nos posicionar.” De acordo com o filósofo existencialista Frantz Fanon, para o negro há somente um destino, e ele é branco. Com isso o filósofo aborda como as culturas coloniais brancas igualavam a negritude com a inferioridade, e como os povos negros queriam escapar dessa posição imposta a eles passavam a negar e rejeitar sua negritude.
Identidade cultural, histórica, negra e feminina
Não apenas o documentário de Nátaly Néri, como algumas outras obras - mesmo que poucas -, ajudam a pensar e refletir sobre a identidade da mulher negra como indivíduo e como grupo em um país com tradição escravocrata. Só a falta de protagonistas negros nos filmes e novelas já nos diz muito sobre nossa história e nossa sociedade, mesmo que não percebamos de imediato. Fazer parte de um filme nesse estilo ou apenas assisti-lo, sendo negro já significa muita coisa. Isabela conta como foi uma experiência especial fazer parte de um filme sem ter de seguir um estereótipo, estando com roupas que combinem com sua tonalidade de pele e exaltando seus cabelos: “Poder ter a vivência do set, em que fomos arrumadas, com roupas que combinavam com a gente, foi incrível e me ajudou, particularmente, na autoestima, o que é essencial para mulheres negras. Na maioria dos dias nós não temos autoestima. Foi lindo de bonito! E é aí que se percebe como a história quer nos diminuir quanto pessoas negras.” Assim, é possível ver como a história e a sociedade não ligam para o bem estar de mulheres, principalmente as negras. Somado ao depoimento de Isabela, Ary Silva afirma: “Ter feito parte desse projeto foi algo muito importante principalmente pra mim, porque eu como pessoa negra na sociedade, senti pela primeira vez que quiseram me ouvir, quiseram ver o que eu tinha para falar a respeito de negritude. Eu nunca consegui falar disso com as minhas amigas que são, praticamente, todas brancas. Eu consegui ver também como além de um processo social, também é um processo muito íntimo e particular, para cada mulher ocorre de uma forma. Ter feito parte desse projeto me trouxe muita compreensão e empatia acerca de mim mesma, sobre as minhas questões e sobre como é importante nos destacarmos por sermos quem somos, e não por um padrão imposto, porque eu ainda sinto que as pessoas se prendem a padrões. Mesmo com essa onda de empoderamento feminino e negro, as pessoas conseguem padronizar até isso. Eu recebi algumas mensagens inclusive, das pessoas vindo comentar. Eu sou uma negra alisada e para elas a verdadeira negra empoderada é a negra que assume seus cachos. Consegui ver com esses comentários o quanto é difícil entender que sermos negras alisadas, como o meu caso, não nos torna menos negras que as mulheres de cabelo crespo, e isso não vai mudar a minha negritude.” Fora a percepção da padronização imposta, também é vista uma generalização das mulheres negras, como se nunca fossem vistas como indivíduos: “Participar do documentário da Nátaly foi importante porque lá eu percebi que existe um estereótipo de ‘mulher negra’, então, se você é uma mulher negra deve se vestir assim, usar o cabelo assado, brinco assim, ou ouvir determinado ritmo de música, e não... Descobri que somos mulheres poxa, e temos nossos estilos. Há um estigma de nos transformar em coletivos, quando não, também somos indivíduos e queremos coisas diferentes das que muitas vezes o movimento negro diz. E tudo bem…”, afirma Thamy Yosuke. Se empoderar da sua negritude deve ser uma coisa livre, sem padrões, independente, sem nenhuma regra.

Representatividade
Sentir-se representado sempre foi algo de extrema importância para minorias oprimidas - minorias apenas em uma posição de prestígio na sociedade, mas maioria na população. Ver que tem um dos seus ali em uma telona de cinema, sendo representado de maneira respeitosa não é gratifica e engrandecedor apenas para a autoestima, mas também para o seu desenvolvimento pessoal. As meninas negras não estão acostumadas a verem atrizes e até mesmo animações que as representem, a indústria cinematográfica contribui para a criação de um padrão que sempre fez todas essas crianças e adolescentes se odiarem, odiarem seus corpos, seus cabelos e seus traços. E ao mesmo tempo que se odeiam por não se enxergarem no “belo”, também se recusam a se reconhecer como parte do grupo ao qual originalmente deveriam pertencer, negam-se como negras, negam os seus familiares como negros, e seguindo o exemplo da sociedade, tentam amenizar sua negritude. Como disseram Ary e Thammy, é possível citar vários exemplos internacionais, principalmente estadunidenses, como Viola Davis, Whoopi Goldberg, Oprah Winfrey, Octavia Spencer e Lupita Nyong’o, mas para citar uma brasileira, você tem que sentar e pensar, a representatividade negra ainda se encontra em falta no Brasil e as grandes empresas e diretores de cinema não parecem dar sinal de tal. Outro exemplo de representatividade internacional também são as 16 atrizes negras que subiram nas escadarias do tapete vermelho do Festival de Cannes, na França, para protestar contra a escassez de papéis principais para negros. Juntas, elas escreveram um livro sobre a dificuldade de ser negra na indústria cinematográfica: “Minha profissão não é ser negro”. E para Thammy, para mudar a estrutura deve se mudar o imaginário. Se uma criança negra desde cedo se vê na TV e no cinema ela se vê como parte de um todo. Os brancos tiram dos negros o sentimento de pertencimento, fazendo com que se sintam estrangeiros em sua própria terra.

O Feminismo Negro
Como se não bastasse ter de lidar com o “fardo” de ser negra, grande parte da população também é mulher. Duas classes historicamente oprimidas por homens brancos, o patriarcado em geral, que, aliás, toma conta do audiovisual não só brasileiro, como também mundial. De acordo com a filósofa existencialista Simone de Beauvoir, o homem se reconhece como ser humano e a mulher como fêmea. O que antes não tinha sido visualizado e hoje é muito mencionado, é que isso também acontece no quesito racial. O branco é um ser humano, e o negro é limitado a uma raça, Nátaly fala sobre isso em um de seus vídeos, como o branco não se reconhece como raça. Logo, na indústria cinematográfica isso não ocorreria de forma diferente, o homem branco é humano, é o que manda e o que tem direitos, e as negras são apenas exceções. Segundo Ary, a mulher negra nunca é vista como protagonista, ela sempre é a coadjuvante, sempre para preencher espaço, só pra dizer que tem uma negra ali. O masculino é o padrão segundo o qual a humanidade é julgada. Ary também fala como a representatividade é muito importante para garotas negras que estão em fase de crescimento, fase de formação, de pensamento, de ideias e que, por si só, o machismo e o racismo já são cruéis. Não há dúvidas de que um dos grandes responsáveis pelo falta de autoestima e de autorreconhecimento é a indústria audiovisual, até porque muita gente, principalmente os adolescentes, vive nesse meio. Eles consomem esses padrões, eles se constroem através desses padrões auto impostos e de certa forma isso ajuda muito com que eles se odeiem cada vez mais, principalmente na questão de mulheres negras, e mulheres em geral. “A questão de gênero e raça, no Brasil, estão interligadas. Portanto, ao se tratar de mulheres negras, o cinema convencional vê uma pessoa com a cor que não pertence àquele lugar, ou seja, que não é igual ao branco ou branca. E depois, vê um gênero que é subalterno. As mulheres negras pertencem a base da nossa sociedade, e o racismo e o machismo estão aí para proibirem essas mulheres de darem voz, texto, iluminação, gravação, direção às suas narrativas. E precisamos contar sobre essas vivências, ou deixar que as mulheres negras decidam o que querem dizer. Existe uma palavra muito usada pelo feminismo ocidental branco que se chama: sororidade. Mas essa palavra é uma mentira, no fundo as mulheres brancas não estão preocupadas com nós negras e negros, porque a nossa estrutura é racista. Então sim, ter a presença de uma mulher branca no cinema é uma conquista? É, mas para quem?”, indaga Isabela.

Objetificação de corpos negros e estereótipos
O modo como são representadas as mulheres negras dentro da indústria também é um problema. Sempre estereotipadas ou vistas de maneira negativa, as negras não se sentem representadas ou empoderadas pelo que veem nas telonas. A hiperssexualização de corpos negros não é uma temática que aborda apenas mulheres, mas também homens. Fora isso há os estereótipos, em que a mulher negra muitas vezes é vista como “violenta e sexualizada, quase nunca numa posição de poder. Quando a gente para pensar na cinematografia brasileira o cenário é ainda mais assustador, o papel de empregada doméstica, de pobre coitada da favela que nunca tem dinheiro, sempre uma mulher que está sozinha com os filhos…”, afirma Ary, também propondo uma reflexão sobre o tipo de mulher que chama mais atenção durante o Carnaval e o tipo de mulher que chama atenção no resto do ano. Para Isabela, o futuro e presente são mais otimistas: “Acho que depende do cinema. Nos últimos tempos vi dois filmes que representaram a mulher negra em posição de poder e escolha. Assim como, podemos continuar vendo a pessoa negra sendo a empregada, em produções que não questionam isso. O cinema mais alternativo, busca de certo modo, repensar toda essa estrutura, e hoje vemos mulheres negras produzindo curtas, longas, videoclipes e outras formas de áudio visual que vão ao contrário da grande narrativa branca eurocêntrica. De alguma forma, gosto de ser positiva então hoje tenho a convicção de estamos sendo bem representadas. São passos lentos, mas muito bem dados.” E também enfatiza como uma produção bem feita e respeitosa pode contribuir para a quebra de muitos estereótipos na sociedade, agindo até mesmo de forma conscientizadora: “Precisamos de uma produção preta, com gente negra no meio e não só no produto final. Não adianta continuar com a imagem da empregada, da drogada, da prostituta ou da babá. Temos que ter a diretora negra, que faz a atriz negra interpretar a dona do negócio, a mulher que é escolhida e amada da forma que é ou, a mulher que na verdade quer ficar solteira. Temos que ter a diretora que irá colocar o homem negro com outro homem negro, ou mulher negra, e vivenciar uma linda história de amor. É, precisamos de narrativas felizes.”
Ser mulher negra em um mercado predominantemente branco
Mas além de viver em constante estado de alerta, combater preconceito, vivenciar assédios e ter sido mantida em um processo de desamor por toda a sua vida, as negras ainda precisam aprender a lidar com um mercado de trabalho quase que majoritariamente branco. Há sim algumas atrizes negras, porém é quase impossível citar cineastas. Levando em conta o número de mulheres brancas no meio do cinema, nem é justo fazer uma comparação com o número de negras. Para uma mulher ocupar um cargo de respeito no mercado de trabalho ela tem que trabalhar o dobro dos homens, para uma mulher negra, o triplo! Ary, Isabela e Thammy, respectivamente, tecem seus comentários sobre as negras e o mercado de trabalho: “Ninguém quer dar oportunidade para uma mulher negra, pelo simples fato de que a sua imagem não vende. E ainda há um padrão de mulher negra que é aceito, não pode ser uma mulher com o cabelo extremamente crespo ou de pele extremamente retinta. Infelizmente isso não vale, não tem o mesmo impacto da mulher alta, magra e branca, que também não está livre de sofrer um assédio. Precisamos dar lugar para essas mulheres negras, precisamos dar voz, dar valor. Por isso acho que é muito importante quando uma mulher negra fala, nós precisamos olhar para essas atrizes que ainda não são em sua grande maioria negras, precisamos dar forças, precisamos mostrar que estamos do lado delas, precisamos divulgar para o mundo que ela é importante e que ela precisa ocupar todos os espaços. Para as pessoas é só mais uma, mas para a gente é importante que a gente se sinta representada, é importante reconhecer a luta da mulher negra na sociedade. É importante também que elas ocupem espaço nos cinemas por trás das câmeras, porque não só adianta elas estarem na frente, porque é muito mais fácil e muito mais imposto que elas continuem um padrão que já é seguido.”; “As mulheres brancas precisam entender que as questões delas não representam mais de 50% da população brasileira. Que é necessário dar espaço às mulheres negras. Não é voz que precisamos, voz nós já temos. Se você é uma roteirista, que precisa de uma diretora, chame uma pessoa negra. Se você é empreendedora e quer aplicar dinheiro, chame uma produtora negra. Se você é uma diretora e precisa de uma figurinista, chame uma pessoa negra. Se você não é nada disso e acompanha uma produção de pessoas pretas, não queira se meter no meio. Ah sim, e caso você seja uma pessoa branca que está no set só com gente branca, questione isso.”; “Olha eu sou atriz, e posso dizer que esses dois quesitos são nossos maiores vilões. Eu não recebo teste se entre parênteses não estiver escrito ‘MULHER NEGRA’, se estiver escrito ‘Precisa-se de mulher de 24 anos’ – é certamente para a mulher branca, e quando vou aos testes só tem pretos sabe ? é uma alegria nos encontrarmos, mas no fundo sabemos que sempre seremos concorrentes de nós mesmos. Ao se falar do machismo... Nem se fala na verdade né, o espaço já escasso as mulheres brancas, quem dirá para nós negras...É necessário ocupar esses lugares e acho que estamos fazendo isso de uma certa maneira, nem que seja pelas beiradas sabe ? É importante que quem chegue nesses espaços leve pelo menos mais duas contigo.... Precisamos de negras conscientes da questão nos espaços de poderes, porque tem lugares que já estamos no topo, porém digamos que o ‘líder’ por não entender a questão estrutural disso não nos permite avançar mais rapidamente, vulgo um Neymar da vida, um dos maiores jogadores do mundo, que se tivesse consciência de quem ele é nesses espaços mudariam-se estruturas...Na minha opinião!”.
Apesar de Nátaly Neri e seu documentário serem referência em uma questão feminista e negra, há também outros filmes do cinema independente que abordam essa temática. O curta-metragem “Bala Perdida” de Sylara Silvério, que concorre no Festival LGBT Recifest, aborda a história de um casal lésbico negro. Para Sylara, para ter mais produções voltadas para um público negro e feminino, é preciso, antes de mais nada, que essa população atue como protagonista: “Mulheres, negras e LGBT`s, já produzem audiovisual. O problema é que muitas vezes essas produções são feitas de forma independente e praticamente sem financiamento. É necessário que haja formação técnica adequada, suporte financeiro e estrutural, reconhecimento artístico e tantas outras coisas para que essas produções sejam exploradas em sua devida potencialidade, além do mais é necessário superar o gargalo de distribuição e aperfeiçoar a formação de público que afeta diretamente a falta de apreciação da população brasileira em relação à produção do audiovisual nacional.”, a cineasta também comenta sobre a superficialização de movimentos sociais e como eles, quando abordados no audiovisual afetam cada indivíduo: “apesar da sociedade sempre estar em constante mudança sobre suas subjetividades e identidades, acredito que hoje em dia essa evolução e discussão sobre gênero evolui muito mais rápido e em pouco tempo, de forma que é preciso estar atenta às mudanças de comportamento da nossa geração para poder tentar compreender as suas complexidades. Tudo isso me faz refletir sobre o que supostamente seria essa superficialização dos movimentos sociais de um modo geral, que aparentemente ainda não entendeu como dominar as ferramentas que está em suas mãos e tão pouco como inserir esse debates no dia a dia das pessoas. Como fazer cinema é um ato político, experimentar e registrar as vivências e mudanças de comportamento da sociedade nesse espaço sempre foi uma realidade. Por isso que eu defendo que apenas fazer cinema não irá suprir essa necessidade de sanar a abordagem superficial dos movimentos sociais, vai depender muito de como essas experiências irão mudar o comportamento de cada pessoa envolvida direta e indiretamente nessa produções, como esses filmes irão chegar às pessoas fora dos circuitos do audiovisual, entre várias outras questões.”
Apesar do futuro ser incerto e do presente ser desapontador, ainda há esperança em profissionais que exaltam a cultura negra e a presença feminina na sociedade. E como disse a própria Isabela: “Axé para todas as pretas que estão no corre!”

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